Mercado imobiliário já perdeu 40% de seus corretores. Entenda os motivos
Nacionalmente, enfrentamos um momento complexo em todos os ramos. O custo de vida está mais caro e o sucesso está mais difícil de ser alcançado. Mas por que existe um desapego generalizado com a profissão de corretor? A resposta clássica seria que “as vendas caíram, logo existe menos trabalho a ser feito”. A tese não está errada, mas qual o motivo real para o “desembarque” de aproximadamente 40% dos corretores de imóveis?
Por estar inserido no mercado imobiliário, sinto-me a vontade em realizar análises e julgamentos pertinentes ao nosso trabalho. Mesmo usando considerações tocantes, espero gerar a conscientização daqueles desejam se aprofundar no tema.
Em busca do “El Dorado”
Costumo comparar o mercado de imóveis de 2004 a 2014 ao alvoroço no garimpo de Serra Pelada (década de 1980). Em busca do “El Dorado”, milhares de profissionais converteram-se ao garimpo. Serra Pelada recebeu vendedores, professores, taxistas, pedreiros, serventes, curiosos e desempregados. Todos almejavam a conquista daquele mercado novo e inesperado. Porém, 10 anos após sua ascensão, o garimpo declinou e forçou a devolução daqueles homens aos seus antigos ofícios. Alguns se especializaram e decidiram seguir na busca do ouro. Tornaram-se garimpeiros. Mas a verdade é que a grande porção de trabalhadores que ali estavam, foram a Serra Pelada simplesmente para sugar o que a terra os provinha, e nada mais. Nada além, ou aquém, do sonho de enriquecer facilmente. E no final, o drástico resultado expôs uma realidade dolorosa: enquanto alguns cavavam, se machucavam, suavam; pouquíssimos lucravam.
Será que, em algum momento, você se lembrou da profissão de corretor de imóveis? Você foi capaz de relacionar o que foi dito à sua experiência imobiliária ou de colegas de trabalho? É desolador, mas a realidade da última década se relaciona em alguns momentos com a agitação do garimpo. Da mesma forma que Serra Pelada, no início do boom imobiliário, o mercado se transformava com rapidez. Existia a necessidade de se sustentar as aberturas de capitais, as novas incorporadoras que surgiam, os novos fundos imobiliários. E para tal fez-se necessário a figura do corretor de imóveis. Afinal alguém precisava vender.
O corretor da última década
“Profissão do momento!” “Mude de vida!” “O sangue das imobiliárias tem poder!” Não é auto-ajuda, muito menos comunicado de Igreja, eram anúncios de imobiliárias durante o boom imobiliário que acontecia. Era praxe, há alguns anos, encontrar diversos anúncios de vagas para novos corretores neste padrão. Tão rápido quanto a nova leva de negócios imobiliários, foi a contratação de novos corretores. A necessidade de se alimentar um mercado em fúria traduziu-se na contaminação da profissão do intermediador de venda.
Diferentemente da classe que se tentava manter no passado, a nova leva de contratados contava com pessoas que não tinha sequer a noção básica de compra e venda de imóveis. Devido a carência de tempo para preparação profissional, a qualidade de opinião e consultoria despencaram. Não havia noção sobre financiamento, documentação e legislação. Os novos corretores, que sonhavam com o longínquo “El Dorado”, eram alistados e literalmente jogados num mercado de burocracias, minúcias e particularidades.
O “exército de corretores”
Em virtude da magnitude que o projeto ganhava e o volume que se formava, nasceu a expressão “exército de corretores”. O intuito era inchar a sua máquina imobiliária com o maior número de pessoas. Não importava qualificação, procedência, grau de instrução ou preparação. Valia de tudo! Era uma forma de convencimento dos incorporadores e construtoras. Fisgava-se o maior número de lançamentos no mercado.
Pensando friamente, se enfrentamos uma batalha e precisamos de força, num primeiro momento escolhemos sempre a equipe maior, independente de sua qualificação. A escolha era pelo maior contingente. Foi desta forma que o mercado de vendas foi conduzido no período do boom. Teoricamente quanto mais “promotores de vendas por telefone” uma imobiliária tivesse, maior seria o resultado para o interessado. Aliás, a nova estratégia das imobiliárias era mantê-los como um telemarketing pessoal. O corretor deixou de ser o grande intermediador e se torna um mero telefonista. Um paradigma histórico fora quebrado por necessidades temporais e emergenciais. O corretor ligava, oferecia o imóvel para 50 a 100 pessoas por dia, e tentava marcar alguma visita ou agendamento para um futuro lançamento. Caso houvesse interesse por parte do cliente, o gerente assumia a negociação e prosseguia em caso de fechamento.
Todas as imobiliárias queriam montar o famoso “exército de corretores”, e que de “armada” não tinha nada. Tais como os grandes conflitos da história e suas convocações em massa, a força de trabalho era formada por vendedores, técnicos, estudantes, professores, desempregados entre outros, isto é nada sabiam sobre mercado imobiliário. Com pouco ou nenhum treinamento, muitos não viram sequer a cor do dinheiro: foram engolidos pela inexperiência ou por grupos fechados de imobiliárias. Alguns mais espertos se sobressaíram e conseguiram o seu sustento por um certo período. Pouquíssimos usufruíram da vitória.
De volta ao velho e bom mercado imobiliário
A nova estratégia surtiu efeito nos tempos áureos do mercado imobiliário. O cliente, entusiasmado com o frenesi e o estado de exaltação das vendas e lançamentos, entrou no mercado pagando por preços absurdos, especulando e comprando imóvel cujo uso futuro era inegavelmente desconhecido. Mas, com o passar do tempo, o furor dos lançamentos em série, vendas em 2 horas e lucratividade exorbitante terminaram. Sobrou o velho e bom mercado imobiliário.
A saída em massa de corretores já era esperada pelo mercado. O futuro reserva espaço apenas para trabalhadores que se especializaram na profissão. Aqueles que entraram para buscar tão somente o “El Dorado”, ou foram fisgados por uma realidade midiática de dinheiro fácil, retornarão aos seus ofícios ou buscarão novas oportunidades. Restarão apenas os mais estruturados e conhecedores, como sempre foi a profissão de corretor de imóveis.
Existe também aquele grupo que relaciona uma possível quebra do mercado de imóveis à sua saída. A essas pessoas digo que em momentos de crise o mercado se reestrutura. Os profissionais pouco experientes ou capacitados podem estar sofrendo devido a falta de resguardo profissional, e estes, com certeza, tendem a buscar novos rumos para suas vidas profissionais. Outros se reestruturarão e aprenderão com muito empenho. Afinal, dentre todos os fatos históricos, podemos dizer com clareza que o mercado sempre persistiu, e que nunca morreu. É fato que momentos difíceis sempre foram enfrentados e percalços superados, entretanto a única e salutar conclusão que tomamos dos acontecimentos passados é que “o mercado imobiliário não acaba, ele apenas se adapta a cada dia”.