Diariamente recebo informações de leitores do Resumo Imobiliário sobre o comportamento inconstante das simulações de financiamento do FGTS Pró-Cotista. No site da Caixa, algumas são realizadas com êxito, outras não. E sempre que o banco é questionado sobre a instabilidade do sistema, a resposta é a mesma: “Os financiamentos através do FGTS Pró-Cotista prossegue normalmente em todas as agências do País”.
Afim de apurar as minúcias do FGTS Pró-Cotista, o Resumo Imobiliário realizou uma pesquisa completa sobre o sistema de financiamento. O resultado foi uma verdade inconveniente de que o Pró-Cotista não passa de um programa de caráter duvidoso e extremamente mal formulado.
O que é o FGTS Pró-Cotista?
O FGTS é um fundo pago pelo empregador ao funcionário, e fica depositado na Caixa Econômica Federal em contas abertas automaticamente com o contrato de trabalho. O FGTS foi criado pelo governo para ser uma reserva de dinheiro para o trabalhador e, ao mesmo tempo, financiar habitações populares e obras relacionadas, como de saneamento básico e de infraestrutura. Afim de esquentar um pouco os financiamentos residenciais, as instituições financeiras resgataram as regras da instrução normativa nº 58 de 04/12/2007 do Ministério das Cidades que regulamentou o programa especial de crédito habitacional ao cotista do FGTS, ou FGTS Pró-Cotista.
Antes uma linha dedicada para pequenos financiamentos, o FGTS Pró-Cotista tornou-se em 27 de maio de 2015, uma saída para a retirada intensa de recursos da poupança, o que travou a linha SBPE. Naquela data, o conselho curador do FGTS aumentou o orçamento do Pró-Cotista de R$ 800 milhões (montante destinado em 2014) para R$ 4,9 bilhões.
A primeira escassez do FGTS Pró-Cotista
Em janeiro e fevereiro de 2016, os R$ 4,9 bilhões destinados em 2015 secaram devido a intensa procura pelo fundo. Milhares de contratos ficaram suspensos por tempo indeterminado aguardando nova injeção de recursos pelo conselho curador do FGTS.
Atendendo aos anseios do mercado imobiliário, em 17 de março de 2016, foi publicado no Diário Oficial da União (doravante DOU) a Instrução Normativa nº 2 do Ministério das Cidades (páginas 27 e 28) que liberava recursos para compra da casa própria através do FGTS Pró-Cotista.
A linha de financiamento recebeu um volume recorde de recursos: R$ 9.500.000.000,00 (nove bilhões e quinhentos milhões de reais).
Seria a salvação dos financiamentos? Infelizmente não. Após longo estudo, abrimos esse montante em diversas categorias e subcategorias. O resultado não foi animador.
Estudo dos recursos do FGTS Pró-Cotista
É de assustar e impressionar: R$ 9,5 bilhões. Mas você sabe para onde vão esses recursos?
Primeiramente a divisão é realizada por região – Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste. Cada uma recebe um pedaço do volume destinado ao financiamento do Pró-Cotista.
A outra divisão realizada pelo conselho curador é através da categoria dos imóveis. Os recursos são destinados para habitações populares, imóveis até R$ 500mil e imóveis com valores de venda entre R$ 500mil a R$ 750mil. De acordo com o DOU de 17 de março de 2016:
a) R$ 4.000.000.000,00 (quatro bilhões de reais) foram destinados ao financiamento de habitações populares;
b) R$ 3.500.000.000,00 (três bilhões e quinhentos milhões de reais) destinados ao financiamento de imóveis cujo valor de venda não ultrapasse R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais);
c) R$ 2.000.000.000,00 (dois bilhões de reais) destinados ao financiamento de imóveis cujo valor de venda esteja limitado a R$ 750.000,00 (setecentos e cinquenta mil reais).”
Além disso, 60% dos recursos são destinados para imóveis novos, enquanto somente 40% será aplicado na transação de imóveis usados.
Estudo do FGTS Pró-Cotista por região
O Resumo Imobiliário também realizou uma pesquisa dos recursos destinados para cada região do País.
Como vimos nos gráficos acima, cada rincão brasileiro recebeu uma fatia dos recursos do FGTS Pró-Cotista, sendo 60% para imóveis novos, e 40% para imóveis usados. Pelas regras do DOU, parte dos recursos seguirão para a área habitacional popular, imóveis com valor de venda até R$ 500mil e outros acima deste teto.
Ilustramos nos gráficos abaixo a destinação dos recursos por categoria para cada região brasileira.
Região Norte – Total de R$ 1,3 bilhão
Região Nordeste – Total de R$ 2,4 bilhões
Região Sudeste – Total de R$ 3 bilhões
Região Sul – Total de R$ 1 bilhão
Região Centro-Oeste – Total de R$ 1,6 bilhão
Estudo de volume aproximado de contratos de financiamento
Uma vez desmembrados os recursos a serem aplicados do FGTS Pró-Cotista, vamos ao estudo de quantos contratos esse montante poderá gerar. Levando em consideração o preço médio do imóvel, em suas respectivas categorias, bem como um estimativa próxima do volume de financiamento a ser gerado, chegamos ao número aproximado de 48.670 contratos.
Ao separarmos esse volume em suas respectivas categorias e regiões chegamos ao seguinte resultado:
Apesar do montante emprestado ao FGTS Pró-Cotista, R$ 9,5 bilhões, a sua subdivisão em subcategorias prejudicou a continuidade do sistema. Exemplificando, a região Sul, poderá gerar neste ano em torno 185 contratos de financiamento de imóveis usados com o valor de venda entre R$ 500mil e R$ 750mil. Ao analisarmos os 28 milhões de habitantes da região Sul, e a disponibilidade de apenas 185 contratos nesta categoria, chegamos a conclusão que a sua formulação foi errônea e extremamente mal executada. É natural que algumas categorias tenham os seus recursos extintos num período muito mais breve que outras.
A análise seguinte mostra o número estimativo de contratos de financiamento, por região, a serem realizados com o montante liberado no DOU de 17 de março de 2016.
A verdade do FGTS Pró-Cotista
Todos os dados deste artigos foram coletados, e posteriormente calculados, a partir do DOU de 17 de março de 2016. Trata-se de documento de acesso público. O Resumo Imobiliário é o primeiro meio de informação a divulgá-lo e discuti-lo em sua abrangência.
Há 1 ano, o FGTS Pró-Cotista tornou-se a “menina dos olhos de ouro” dos financiamentos imobiliários. Atraídos por juros baixos, destacou-se rapidamente num mercado volátil e escasso de recursos (funding). Mesmo após a liberação de R$ 9,5 bilhões para 2016, o dobro da verba de 2015, afirmo categoricamente que o FGTS Pró-Cotista não é a solução.
O primeiro motivo é o controle do Conselho Curador. Todas as verbas provenientes do FGTS demandam a aprovação do Conselho, seja qual for o fim. Os investimentos do FGTS não são integralmente destinados ao financiamento imobiliário. É um órgão político que pode regular a remessa de verbas para obras de infraestrutura, saneamento e, por fim, o mercado imobiliário.
A destinação desigual dos recursos também chama a atenção. Se compararmos a remessa de recursos com a população de cada região, chegaremos a seguinte classificação para a destinação de recursos por habitantes:
Primeiro – Região Centro-Oeste – R$ 111,77/habitante.
Segundo – Região Norte – R$ 78,48/habitante.
Terceiro – Região Nordeste – R$ 43,08/habitante.
Quarto – Região Sudeste – R$ 36,55/habitante.
Quinto – Região Sul – R$ 34,74/habitante.
A necessidade de financiamento é nacional. O déficit habitacional brasileiro acontece em todas as regiões, independente de riqueza ou localização geográfica. Além disso, os recursos do FGTS são provenientes dos trabalhadores. Os empregados estão financiando o mercado atual, e de fato, 80% da massa de trabalhadores encontra-se nas regiões Nordeste, Sudeste e Sul. Causa-me espécie um destinação de recursos altamente desproporcional e desigual como vimos acima.
O último item é o “salve-se quem puder”. Como os recursos são divididos por regiões, categorias, novos e usados, de fato, alguns se extinguirão muito antes do que outros. Vamos analisar os imóveis usados até R$ 500 mil na região Sudeste. Para esta categoria, o Pró-Cotista, destinou apenas R$ 455 milhões para financiamento, ou aproximadamente 1.420 contratos. Se houver o consumo total destes recursos, a região Sudeste não poderá mais usá-lo, e o sistema de simulação automaticamente travará. Sinceramente, R$ 455 milhões para Rio de janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo e São Paulo, não é nada!
E o montante já começou a secar! A Caixa não confirma, mas diversas simulações não apontam mais o FGTS Pró-Cotista como linha de financiamento. E assim seguirá nos próximos meses. Categoria após categoria, região após região, secando no mercado de financiamentos. Infelizmente não temos acesso às informações da Caixa. Atualmente, sem os dados cruciais não conseguimos saber se a categoria e região está próxima do fim, ou ainda está abastada.
Finalmente, para você que quer usar o FGTS Pró-Cotista, reze bastante, acenda uma vela, e torça para que a sua categoria e região ainda estejam ativas. Aliás, esse sistema não passa de uma roleta de cassino: ninguém sabe o resultado final.